Como planejar na incerteza: adaptando a estratégia para um futuro incerto
Por Frederico Madureira, partner Kienbaum
O planejamento estratégico tradicionalmente é visto como um método para avaliar alternativas, definir objetivos, estabelecer metas e definir recursos, estruturas e pessoas em um plano de 3 a 5 anos. Diante da crise desencadeada em todo o mundo pelo Covid-19, parte significativa dos planos estratégicos das empresas perdeu o sentido, levando muitos a questionarem se ainda faz sentido planejar num mundo tão incerto quanto o atual.
Nesta visão tradicional, o planejamento normalmente ocorre em um fórum seleto e reduzido da empresa, composto por CEO e Diretores, com participações pontuais de gerentes e coordenadores. As discussões da estratégia ocorrem longe da ponta – ou seja, da operação – e sem participação de clientes e outros stakeholders relevantes para o negócio. Durante as discussões, o grau de abertura para pensar fora da caixa e inovar é extremamente reduzido. Direcionados por um viés de eficiência e com modelos de remuneração que premiam o atingimento do que foi previsto, os executivos raramente topam investir recursos para testar novos conceitos e paradigmas. Após as definições principais, as metas são desdobradas e os projetos estratégicos aprovados são tocados dentro de estruturas conhecidas, com baixa integração entre áreas, reforçando silos e o poder da hierarquia.
No contexto atual de interrupção dos negócios, os paradigmas utilizados para estabelecer a estratégia anterior não fazem mais sentido. No entanto, descartar o planejamento e a reflexão sobre a estratégia em um momento tão incerto pode gerar um comportamento reativo, onde a empresa responde a sucessivas mudanças no ambiente, sem capturar oportunidades e se preparar para um momento de retomada dos negócios. Agora sim, o tempo de planejar e pensar de forma estratégica vai começar!
Como planejar na incerteza
A partir do entendimento da situação atual, faz-se necessário desenvolver uma visão mais ampla sobre as possibilidades de futuro. Este tipo de olhar para fora tende a ser negligenciado num ambiente normal onde as incertezas são menores. Agora, como não se sabe quando a crise terminará e como será a retomada, é fundamental desenhar diferentes cenários, compartilhá-los com as lideranças da empresa, acompanhar o nível de incerteza sobre o futuro e traçar ações de curto, médio e longo prazo atreladas aos diferentes cenários. Este trabalho deve considerar alguns elementos, dentre eles:
- a profundidade da crise (queda de demanda);
- extensão (quanto tempo pode durar);
- formato de recuperação (rápida, lenta, sobe e desce).
Além disso, recomenda-se avaliar e acompanhar algumas variáveis externas como a evolução da saúde nos principais centros urbanos, o impacto de medidas governamentais na crise, o ambiente macroeconômico e a demanda específica de negócios do seu setor. Por fim, este trabalho se torna dinâmico, com acompanhamento constante e se torna parte da agenda estratégica da empresa.
Momento para discussão
Ao mesmo tempo, todo planejamento estratégico é um momento para explicitar questões que não estão claras para todos ou conflitos velados que precisam ser resolvidos. A crise trouxe urgência para isso, não é mais possível adiar discussões de questões relevantes. Empresas que concentravam seus investimentos no mesmo paradigma de modelo de negócio (por exemplo, lojas físicas ao invés de online) ou que evitavam conversas com seus concorrentes com medo de serem copiados ou que mantinham estruturas organizacionais rígidas e com baixa colaboração entre áreas precisarão enfrentar rapidamente as discussões que foram postergadas durante um ambiente de normalidade. Ancorar as discussões na identidade da empresa, na sua missão ou no seu propósito, além da imediata necessidade de sobrevivência, são formas de conduzir conversas difíceis, mas fundamentais para a transformação do negócio.
Interação e fluxo de informações na empresa
Uma nova forma de planejar também deve promover maior interação e um fluxo contínuo de informações dentro da empresa. Em grandes organizações, é comum haver uma grande distância da estratégia para a execução. Para capturar oportunidades e agir de forma estratégica, é necessário que todas as áreas e pessoas tenham um entendimento compartilhado da estratégia e do contexto do mercado. Não deve haver dúvidas sobre quais são as prioridades e diretrizes estratégicas da empresa. Oportunidades e ameaças devem ser identificadas por todos e os planos de ação revistos com maior frequência. A comunicação deve ser em duas vias: identificando sinais na ponta e levando rapidamente para os decisores; ao mesmo tempo, transmitindo com clareza as prioridades e ações para quem está na operação.
Novo papel do RH
Neste novo contexto, a área de Recursos Humanos também assume um novo papel, mais protagonista e mais próximo das áreas de negócio. É natural que os gestores não saibam como se portar neste novo ambiente, como reestruturar, avaliar e dar suporte para suas equipes. Desta forma, há um espaço para desenhar estruturas operacionais mais pragmáticas, flexíveis e colaborativas. Isso sem estender na discussão de novos formatos de trabalho e desenvolvimento de novas competências como inovação, capacidade de adaptação e pensamento estratégico. Com isso, surge um espaço relevante para participar ativamente das discussões estratégicas e colocar as pessoas no centro do modelo de negócio.
Resultado: um planejamento dinâmico
Por fim, o processo de planejamento se torna mais fluído, adaptativo e dinâmico. O objetivo fim não é mais estabelecer uma meta, mas criar uma capacidade de adaptação contínua da estratégia diante de mudanças externas, testar novos modelos de negócio e aproximar a formulação estratégica da execução. Saindo do curto prazo, cujo objetivo é garantir a saúde dos funcionários e a continuidade do negócio, gerindo fluxo de caixa e capturando oportunidades, a estratégia adaptada no médio prazo deve estar preparada para flutuações na demanda e oferta, adaptando-se a diferentes cenários e identificando setores que sairão mais rápido da crise. No longo prazo, a estratégia deve ainda incorporar os novos comportamentos dos consumidores, criando modelos de negócio inovadores e que reflitam novas tendências que estão emergindo.
Em suma, a nova forma de planejar e adaptar estratégias para um futuro incerto, deve contemplar:
- Discussão de cenários futuros e seus impactos no negócio;
- Alinhamento da estratégia com a execução;
- Ampliação da discussão estratégica para outros níveis de liderança;
- Desenvolvimento on the job da visão estratégica em todos os níveis de liderança;
- Maior interação com stakeholders, inclusive com concorrentes;
- Adaptação contínua da estratégia diante das mudanças de mercado.
A era de planejar está apenas começando e, para que a empresa esteja preparada para o futuro, é essencial desenvolver uma estratégia personalizada e inteligente. A Kienbaum, com sua consultoria especializada de negócios focados em estratégia, pode te ajudar nesse processo. Entre em contato conosco!